Uma crítica sobre os filmes e a apologia da maconha by Carolina Lago Obadia

Lago biscoito Antes de ir ao relevante tema desta monografia, apreciaria falar de Carolina Lago, Caró, que gera associações em meu cérebro como Caró Cora Coralina Lago… Ex aluna na UERJ, psicóloga e poetisa, maravilha de combinação, inteligente, pessoa especial, importante para esta humanidade, para este Brasil em tempos tão sombrios. Poetisa incrível, tem uma sensibilidade e um carinho para com o próximo e para com as palavras. Seus versos são fantásticos. Explora a palavra com zelo, com um humor e um respeito que contagiam o ouvinte, causam experiências estéticas gerando reflexões, mudando percepções e tudo isto com muita elegância.

Tive a oportunidade especial de ouvir vários… E, por ser capaz, competente, sensível e generosa isto permite-lhe exercer uma “doma” espontânea sobre as letras vivas dentro das palavras que cavalgam graciosamente surpreendendo com novas configurações e deliciando os ouvidos.

Carol, resolvi extrair algumas ilustrações de teu Facebook, e posto logo esta de Cora Coralina para te definir melhor, para quem não te conhece, segue o poema

Cora CoralinaAos Moços – de Cora Coralina

Eu sou aquela mulher
a quem o tempo muito ensinou.
Ensinou a amar a vida. 
Não desistir da luta.
Recomeçar na derrota.
Renunciar a palavras e pensamentos negativos.
Acreditar nos valores humanos.
Ser otimista.
Creio numa força imanente
que vai ligando a família humana
numa corrente luminosa da fraternidade universal.
Creio na solidariedade humana.
Creio na superação dos erros e angústias do presente.
Acredito nos moços.
Exalto sua confiança, generosidade e idealismo.
Creio nos milagres da ciência
e na descoberta de uma profilaxia futura dos erros e violências do presente.
Aprendi que mais vale lutar do que recolher dinheiro fácil.
Antes acreditar do que duvidar.

Esta é você Carolina Lago Obadia, filha querida de pais queridos e competentes, Dra. Rosa e Dr. Ignácio.

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Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro de Educação e Humanidades Instituto de Psicologia
Filmes cinematográficos como instrumentos de veiculação de informações e apologia da maconha
Monografia apresentada à Universidade do Estado do Rio de Janeiro, para aprovação na disciplina Monografia II, como exigência para obtenção do título de bacharel em Psicologia, sob a orientação do Prof.º Dr º Celso Lugão da Veiga
Rio de Janeiro 2014

AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar à Uerj, que permitiu meu retorno para concluir essa monografia e esse ciclo em minha vida. Agradeço ao professor, orientador e amigo Celso Lugão, pela sugestão e orientação do tema. Pela caixa de email sempre cheia de boas informações e carinho. E acima de tudo, por acreditar e querer ver de perto o meu crescimento. Às professoras Simone Cagnin e Tamine J. Lean, pela paciência de receber a monografia para avaliar com um tempo tão curto. Agradeço aos meus pais pela compreensão de que “tudo tem seu tempo”. Agradeço também por baixarem o volume da televisão quando eu precisava me concentrar. Pelos livros de Psicologia dados de presente no natal. E por sempre quererem me ver feliz, independente do caminho profissional que eu esteja seguindo. Agradeço finalmente aos amigos que me esperaram nas festas que eu não fui. Que passaram um ano ouvindo sobre o tema com cara de compreensão. Que me passaram referências de filmes. Que gritaram “Termina logo isso aí!”.

chaplin-and-edna-purviance-charlie-chaplin “Num filme o que importa não é a realidade, mas o que dela possa extrair a imaginação.” (Charles Chaplin)

SUMÁRIO
RESUMO______________________ 7
INTRODUÇÃO____________________8
1-HISTÓRICO _____________ 11

1.1 – História da Cannabis Sativa no mundo____11

11 1.2 – História da Cannabis Sativa no Brasil___ 13
2 CANNABIS SATIVA_____________16

2.1 – Conceito de drogas____________16

2.2 – Cannabis Sativa: Sobre a planta_______17

2.3 – Consequências do uso_________________18

2.4 – Uso medicinal_______________19

2.5 – Malefícios_____________________20
3 SISTEMA DE RECOMPENSAS CEREBRAL E NEUROPLASTICIDADE_____ 22

c3edf41024fa06fdd554b226e8fced373.1 – Sistema de Recompensas Cerebral_________22

3.2 – Neuroplasticidade_______________23
4 PODER DAS MENSAGENS__________________25

4.1 – Representações Sociais___________________25

4.2 – Percepção Subliminar e Priming Semântico______27

4.3 – Apologia: Da análise do conceito_________________30

4.4 – Apologia de álcool e cigarro ________________________31
5 MEIOS DE COMUNICAÇÃO________________________34

5.1 – Televisão__________________________________34

5.2 – Revistas_________________________________36

5.3 – Internet___________________36

5.4 – Música_______________________36
6 FILMES____________________________38

6.1 – Classificação Indicativa_____________________39

6.2 – Lista de filmes______________________________42
7 RESULTADOS___________________________________43

7.1 – Análise das mensagens________________43

7.2 – Comentários gerais____________________48
CONCLUSÃO_____________________________50
REFERÊNCIAS ______________________________52

desenho caró

RESUMO
O uso das substâncias psicoativas remonta há milhares de anos, sendo algo presente na história da humanidade. No vasto universo das drogas encontra-se a Cannabis Sativa, a maconha, categorizada como droga psicotrópica. Esse tipo de droga age no sistema nervoso central alterando as funções cerebrais e mudando temporariamente a percepção, o comportamento e a consciência, causando ainda um desbalanço no sistema motivacional. As consequências de seu uso é tema de muitos estudos, e, embora seu uso medicinal seja conhecido, seus malefícios também são, sendo eles em maior número, ou seja, são muitos, perigosos e alarmantes, tanto para o indivíduo como para a sociedade. Esses dados deveriam ser divulgados e conhecidos pela população em geral, no entanto, a mídia como um todo reporta e propaga diversas informações falsas sobre a Cannabis Sativa, informações estas que não provém de evidências científicas. Quando estas mensagens fazem o louvor da droga, promovem ainda apologia da mesma, sendo que estas mensagens tanto podem ser transmitidas de maneira clara e consciente como também de maneira subliminar. Esta monografia tem por objetivo levantar mensagens propagadas pela mídia, em especial os filmes de cinema, relativos à droga em questão, refletindo se essas mensagens podem contribuir para a representação social da maconha.
drogas-de-abuso-10-638ABSTRACT
The use of psychoactive substances dating back thousands of years, something present in human history . In the vast universe of drugs is Cannabis Sativa , marijuana , categorized as a psychotropic drug. This type of drug acts on the central nervous system by altering brain function and temporarily changing the perception , behavior and awareness, even causing an imbalance in the motivational system . The consequences of its use is the subject of many studies , and although its medicinal use is known, their harmfull efects is also being them in greater numbers , many dangerous and alarming , both for the individual and for society . These data should be disclosed and known by the general population , however , the media reports as a whole and various spreads false information about the Cannabis Sativa , this information is not from scientific evidence . When these messages are the praise of the drug , even promote apology of same , and these messages can either be transmitted clearly and consciously as well as subliminally . This monograph aims to raise messages propagated by the media , especially cinema films relating to the drug in question , reflecting whether messages can contribute to the social representation of marijuana.

Imagem linda INTRODUÇÃO
O uso de substâncias capazes de alterar o psiquismo existe desde os primórdios da história humana. Existem muitos motivos para os seres humanos usarem drogas, seja para aliviar as angústias do dia-a-dia, frustrações e ansiedades, seja pela busca do prazer. Existirá sempre um contingente cultural, familiar, individual, social, psicológico e biológico. (SILVA, 2007) Portanto, o uso de drogas e sua dependência são um resultado de múltiplos fatores, incluindo predisposição genética e fatores sociais, como por exemplo pressão de amigos, querer pertencer a uma subcultura, excitação de estar envolvido em ação ilegal, expressão de hostilidade, independência de pais e professores (figuras de autoridade), e redução de sentimentos e sensações desagradáveis. (CASTALDELLI-MAIA et al, 2012) F. Jungerman (2005), sugere em seus estudos que estamos dando menos atenção à esta droga em decorrência de seus efeitos nocivos serem aparentemente mais brandos que de outras drogas. A maconha, no entanto, é a droga mais utilizada quando comparada às outras drogas, sendo a droga ilícita mais consumida do mundo. Algumas das pessoas que já provaram a droga tornam-se usuários diários e ou dependentes. O uso de substâncias psicoativas é uma questão importante não só para a sociedade brasileira como em qualquer lugar do mundo. Em qualquer sociedade, é importante investigar como o uso de drogas, a dependência e o vício são retratados na mídia, nesse estudo em especial nos filmes cinematográficos, e a partir desse ponto, verificar se esse conteúdo pode influenciar o público. A mídia pode retratar tanto uma tendência em relação ao contexto no qual está inserida, quanto influenciar na formação de crenças e atitudes sobre determinados assuntos. (NOTO et al, 2003) Filmes são um meio poderoso de difusão de informações e não só são influenciados pela sociedade e cultura, como o inverso também ocorre, ou seja, os filmes por sua vez tem o papel de influenciador. Quando se pergunta se a vida imita a arte ou a arte imita a vida, a resposta seria: os dois. (OLIVEIRA, 2006) Listar filmes que trazem a temática para observar em que cenas a maconha é apresentada, analisando o tipo de mensagens que estão sendo vinculadas ao uso da maconha, e promover uma discussão sobre como este conteúdo pode influenciar o espectador, é o objetivo do presente estudo. Se essas mensagens representam o que acontece na realidade, se destacam todos os aspectos relativos à droga ou se situa apenas como discurso de louvor, o que configura apologia. Isso levanta questões importantes tanto para a sociedade como para os profissionais da saúde. Os filmes em geral são feitos com fim de entretenimento, porém, levantam uma série de questões e informações
woman & wolf 9
que contribuem para a formação da representação social acerca de um tema, nesse estudo, o uso da maconha. Desta forma, este estudo teve como finalidade, além de relatar ocorrências similares na mídia como um todo, avaliar uma amostra de 20 filmes cinematográficos com grande alcance de público no período que compreende o ano 2011, 2012 e 2013, que trouxeram a temática em questão à tona, de maneira explícita ou não em seu título e sinopse do filme, relacionando também ao gênero dramático e sua classificação indicativa. Os filmes cinematográficos são uma mídia potente em alcance de público, podendo ser um instrumento relevante na construção do imaginário e das representações sociais acerca do tema. Acredita-se na relevância dessa monografia por tratar de um assunto polêmico e que ainda requer muito esclarecimento científico sobre o assunto, pretende-se com ela levantar e destacar dados relativos à maconha que estão sendo propagados para o público pela mídia, em especial pelo cinema. Assim, o capítulo 1 abordará de forma sucinta um histórico sobre o uso de drogas no mundo e no Brasil, com especial atenção à Cannabis Sativa, ou seja, o consumo da maconha. O capítulo 2 irá abordar a Cannabis Sativa, falando, inicialmente sobre o conceito de drogas. Em sequência, falará sobre a espécie da planta em si, o modo e as consequências fisiológicas e psicológicas do uso. Falará ainda sobre o uso medicinal e sobre seus malefícios. O capítulo 3 abordará o tema do droga...obrigado pra mim nãoSistema de Recompensas e a neuroplasticidade, mostrando como o vício da droga se estabelece. O capítulo 4 falará sobre o poder das mensagens propagadas pelos filmes e mídia e suas implicações sobre o público. Apresentará a teoria das representações sociais em primeiro lugar. Depois, falará sobre a percepção subliminar e o priming semântico. Abordará ainda o conceito de apologia e, por fim, demonstrará estudos similares encontrados na literatura, relacionando a mídia e suas implicações sobre o uso de outras drogas, tais como o alcóol e o cigarro. O capítulo 5 abordará os meios de comunicação e trará exemplos de mensagens propagadas relativas à Cannabis Sativa, na televisão, na mídia impressa (jornais e revistas), na internet e na música brasileira, com o objetivo de mostrar que a apologia da droga pode estar sendo feita de uma maneira mais ampla e generalizada, não só através do cinema, mesmo sendo esse o foco da monografia. O capítulo 6 abordará os filmes analisados, foco principal da monografia. Apresentará um subcapítulo dedicado a explicar como funciona e quais são os critérios da Classificação Indicativa, indicação sobre a faixa etária adequada para assistir o filme. Esse capítulo traz ainda a lista dos 20 filmes analisados para o presente estudo, mostrando seu gênero dramático, seu ano de estréia, país de origem e classificação etária indicativa.
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O capítulo 7 fará uma análise das mensagens divulgadas pelos filmes analisados e tecerá comentários gerais e sobre cada filme. A conclusão irá mostrar a relação entre os temas da monografia, o sistema de recompensas, o processo de percepção subliminar, a apologia, a mídia e os filmes contribuindo para a representação social da maconha.
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Menina maluquinha 1 HISTÓRICO
Como o uso de drogas sempre esteve presente, é essencial mencionar sua história nos estudos que se propõem a discutir sobre o tema. Alterações de consciência acompanham a história da humanidade desde seus primórdios. O convívio do homem com as drogas é muito anterior ao interesse pelo assunto como motivo de alarme social, anterior ainda aos estudos e pesquisas sobre a temática. A busca pelo prazer, a busca pelo alívio da ansiedade através do consumo e ingestão de substâncias, naturais ou sintéticas, sempre foi e será vivida pelo homem. (COLASANTI et al, 1996) Os subcapítulos que seguem irão abordar de forma sucinta a história da Cannabis Sativa pelo mundo e também no Brasil, com o objetivo de relatar quando o uso da droga em questão passou a ser difundida em cada cultura. Esse conhecimento é importante para mostrar como essa relação aparece em diversos contextos, culturas, objetivos e motivações diversas, como remédio ou como veneno, de forma divina ou demonizada, revelando uma prática humana milenar e universal.
1.1 História da Cannabis Sativa no mundo
Esse subcapítulo tem por objetivo abordar a história da droga, Cannabis Sativa, pelo planeta, de maneira sucinta. Seu lugar de origem e a cronologia da sua disseminação pelos diversos locais do globo terrestre. Como são muitos os historiadores que tratam do assunto na literatura, nem sempre há um consenso acerca da história da droga, o que pode ser também um dos motivos que eu lispectorpode cooperar para a formação de mitos em relação à maconha e seu uso. É importante, portanto, traçar e entender melhor sua história. De acordo com C. Olivenstein (1984), admite-se que o cânhamo é originário da Ásia Central e Ocidental. Seu nome varia de acordo com a região. É chamado de bang em persa, hauf em alemão, keunp em holandês, cannabis em latim, cáñamo em espanhol, kender em turco, chu-sto em chinês, marijuana no híspano-mexicano. O uso da maconha é conhecido há cerca de 12.000 anos. Com a planta, os gregos e os chineses faziam cordas que eram utilizadas em navios. A tese que localiza a origem do uso da Cannabis na China, há 4.000 anos atrás, é atribuída ao trabalho em farmacologia do imperador e farmacêutico chinês Shen Nieng, que advogava o uso da planta, no tratamento do reumatismo e apatia, e como sedativo. O documento mais antigo sobre o cânhamo é o tratado chinês de botânica, o “Rhy-ya”, do século XV antes de Cristo. Como medicamento, começou a ser usada na China há 3.000 anos atrás, no tratamento de constipação intestinal, malária, dores reumáticas e doenças femininas. Era também usada para estimular o sono e o apetite. (OLIVENSTEIN, op.cit.) É na Índia, em 1.000 a.c., que se encontram os indícios de uso da droga de maneira não só
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wolf and woman medicinal como também transcendental e religiosa. O cânhamo, para os monges indianos, resultaria da metamorfose dos pêlos das costas de Vishnu. Na mitologia hindu, Vishnu, juntamente com Shiva e Brhama, formam a Trimúrti, a trindade hindu, na qual Vishnu é o Deus responsável pela manutenção do universo. Designavam essa planta pelos nomes de “Vijahia”, fonte de felicidade e de sucesso, e de “Ananda”, que produz a vida. Os sacerdotes cultivavam em seus jardins, e utilizavam as flores, folhas e caules cozidos com o intuito de fabricar um líquido potente denominado bhang. (NAHAS, 1986) Costa e Gontiès (1997), dissertam sobre a chegada da Cannabis na Grécia com os rituais dionisíacos, em torno de 534 a.c. Já sua disseminação na Europa como um todo é mais tardia, e tem relação com o movimento das Cruzadas, entre os séculos XI e XIII. Nesta mesma época, nas Américas, relata-se o uso por parte dos Astecas em rituais religiosos. Quando a maconha se espalhou pelo Oriente Médio, vinda da Índia e disseminada pela rota da busca pelas especiarias, entre os séculos XIII e XV, houve uma grande aceitação desta droga pela população. Como o consumo de álcool era proibido pela religião muçulmana, os povos passaram a fazer uso da maconha, tendo em vista a sua capacidade de produzir estado de euforia sem que levasse ao pecado mortal. (OLIVENSTEIN, 1984 Já em Cuba por volta de 1492, existem relatos de haver o hábito de inalar a fumaça de folhas secas incandescentes para provocar “prazeres singulares” (SONENREICH, 1982). No Brasil, conforme será abordado no subcapítulo a seguir, a maconha teria sido introduzida pelos escravos africanos, nos séculos 00028XVI e XVI, trazida nos navios negreiros. Um pouco mais tarde, nos Estados Unidos, em 1720, a planta do tipo fibra era cultivada na região litorânea, e as fibras do caule eram utilizadas na confecção de cordas, barbantes, tapetes, velas, sacos e cintos. Já das sementes extraia-se o óleo para sabões, tintas, dentre outros (NAHAS, 1986). A primeira pessoa a levar haxixe para para estudo, na França, teria sido o naturalista Sonnerta, em 1782, ao final de uma viagem a Índia. Um dos famosos estudos sobre a maconha indiana foi publicado em 1845 por Dr. Moreau, e o título da obra era “Sobre o haxixe e a alienação mental”. Moreau postulava a semelhança entre sonho e loucura e colocava o estado que o usuário experimenta ao estar intoxicado como um estado induzido de loucura. Por volta de 1850, suas propriedades anticonvulsivantes, analgésicas, antiansiedade e antivômito foram pesquisadas por vários médicos europeus. (OLIEVENSTEIN, 1984) A posse, o uso e a venda da cannabis começou a se tornar ilegal no início do século XX em diversos países ocidentais, principalmente nos Estados Unidos. A proibição do consumo da erva se tornou global após a Convenção Internacional do Ópio, assinada em 1912 na cidade de Haia, quando diversas nações decidiram proibir o comércio mundial do “cânhamo indiano”. Desde então, as leis que regulamentam a proibição da planta se intensificaram ao redor do mundo. Na últimas
Flor 13
décadas, no entanto, surgiram diversos movimentos pela legalização da cannabis, enquanto alguns países e regiões passaram a permitir o uso do psicoativo sob certas circunstâncias, como foi o caso dos Países Baixos. Em 10 de dezembro de 2013, o Uruguai se tornou o primeiro país do mundo a legalizar o cultivo, a venda e o consumo da cannabis. O subcapítulo a seguir abordará a inserção da Cannabis e seu uso no Brasil, conforme já foi mencionado, com a finalidade de relatar a situação atual e pregressa do uso da maconha e da política de drogas no país.
1.2 História da Cannabis Sativa no Brasil
A história da maconha no Brasil tem seu início com a própria descoberta do país. A maconha é uma planta exótica, ou seja, não é natural do Brasil. Foi trazida para cá pelos escravos negros, daí a sua denominação de fumo-de-Angola. O seu uso disseminou-se rapidamente entre os negros escravos e nossos índios, que passaram a cultivá-la. (CARLINI, 2006) Há uma outra hipótese acerca da origem da maconha que advoga sobre a existência em populações indígenas na Amazônia, e que estes já utilizavam na forma medicinal, no preparo de chás e pós pelos pajés, como também nas cerimônias religiosas com o intuito de manter contatos com as divindades (MONTEIRO, 1984). Costa e Gontiès (1997) enfatizam, no entanto, que as sementes do fumo da angola, chegaram ao território brasileiro no século XV vindas em bonecas de pano embrulhadas na ponta das tangas pelos escravos africanos. Estes autores ainda apontam que a maconha era bastante utilizada principalmente no Norte e Nordeste do Brasil, tendo em vista que esta desenvolvia-se nas lavouras de cana de açúcar. Anos mais tarde, no século XVII, a Coroa Portuguesa passou a se preocupar com o uso da Cannabis, mas não no sentido de regular ou compreender os efeitos do uso, mas no sentido de incentivar o plantio. Dizia ser de interesse da metrópole, já que havia larga aceitação da classe médica. Apenas na segunda metade do século XIX esse quadro começou a se modificar, quando chegaram ao Brasil as notícias dos efeitos hedonísticos e sobre os malefícios da maconha, principalmente após a divulgação dos trabalhos do já citado Prof. Jean Jacques Moreau, da Faculdade de Medicina de Tour, na França. (COSTA e GONTIÈS, ibid.) Porém, ainda no final do século XIX encontrava-se atestados médicos indicando a planta no tratamento de bronquites, por exemplo. Chegaram a ser comercializados sob a marca “Grimault” como “cigarros índios”, indicados para asma, catarros, insônia e flato. Existe ainda esse registro de propaganda em mídia impressa e posters. No início do século XX, a planta ainda aparecia nos compêndios médicos brasileiros. No entanto, a indicação de uso (bula) já continha em sua descrição
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01750 - FRASE - MUDE MAS COMECE DEVAGAR - CLARICE LISPECTOR - CAPAS PARA FACEBOOKcertas restrições quanto ao mesmo. (id., ibid.) Somente na década de 30, a repressão contra o uso da droga no Brasil ganha força com a contribuição de Dr. Pernambuco Filho, representante brasileiro na II Conferência Internacional do Ópio em Genebra, que leva o tema da maconha para ser discutido, sendo que a agenda tinha o ópio e a coca como tópicos principais. (id., ibid.) Dr. Pernambuco Filho descreve a maconha como “mais perigosa que o ópio”, conseguindo poucos anos a frente a proibição da venda da maconha. A proibição total do plantio, cultura, colheita e exploração por particulares da maconha, em todo território nacional, ocorreu em 25/11/1938 pelo decreto-lei numero 891, do Governo Federal. (CARLINI, 2006) Desde então, existiram muitos estudiosos das consequências do uso da cannabis sativa, dentre eles, no Brasil, destaca-se o psiquiatra Ronaldo Laranjeira. Desde 1987 produz estudos relativos ao uso de drogas, mostrando os diversos malefícios causados pelo abuso delas. Os dados baseados em evidências relativos ao malefícios do uso da cannabis sativa serão apresentados no capítulo 3. Laranjeira (2010) diz que a lentidão em não reconhecer danos faz que mudanças no status de qualquer droga, e principalmente quando um aumento de consumo é uma das possibilidades, devam ser encaradas com cuidado.  2 Tanto a intensidade do debate acerca da legalização das drogas quanto o clima ideológico sobre as drogas advém do fato de quase não haver informação objetiva para avaliar as políticas que tratam da questão. Um dos argumentos dos defensores da legalização da maconha é o de que a proibição total causa mais dano do que a legalização total. A grande fraqueza desse tipo de raciocínio é que não leva em consideração que a legalização produz maior oferta e, portanto, expõe um número maior de pessoas ao consumo e a suas complicações. Outra retórica utilizada pelos defensores da legalização da cannabis sativa é a de que o uso da substância estaria relacionado com a liberdade e os direitos do cidadão. (LARANJEIRA, 2010) No entanto, a própria adicção representa uma falta de liberdade, sendo que o termo “adicção” em português designa a inclinação, apego de alguém por alguma coisa e “adicto“, define o indivíduo propenso à prática de alguma coisa de forma compulsiva. A origem do termo vem do latim, “addictum” – o oferecido. Nos tempos da Roma antiga, o termo designava o indivíduo que, para pagar uma dívida, se convertia em escravo por não dispor de outros recursos para cumprir o compromisso contraído. O adicto se assumia como marginal; alguém que, fatal ou voluntariamente, fora jogado numa condição inferior a que tivera até então. O adicto parece, assim, como aquele que perdeu a sua identidade e, simultaneamente, adotou uma identidade imprópria como única maneira possível de saldar sua dívida consigo mesmo. (KALINA, 1986) No entanto, a campanha pela legalização, foi uma das bandeiras do político F. Gabeira, que
Quintana 15
tentou implementar o cultivo do cânhamo para fins industriais. O ex-presidente F.H. Cardoso, que é membro da Comissão Latino-americana de Drogas e Democracia, apoia a descriminalização da posse de pequenas quantidades para uso pessoal da maconha e afirma que a repressão como é feita resulta num aumento de violência e consumo. Mesmo assim, defende que devem-se criar mecanismos que desestimulem o uso das drogas. Tanto Gabeira com F.H. Cardoso apresentam argumentos já refutados por Laranjeira. Hoje em dia, pela legislação, o artigo 28 da lei nº 11.343/2006, de 23 de agosto de 2006 prevê novas penas para os usuários de drogas no Brasil. As penas previstas são: advertência sobre os efeitos das drogas (saúde, família e etc); prestação de serviços à comunidade ou medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. A mesma lei (artigo 28, § 2º) estabelece o critério para ojuiz avaliar se uma quantidade se destina ao consumo ou não. O juiz deve considerar os seguintes fatores: o tipo de droga (natureza), a quantidade apreendida, o local e as condições envolvidas na apreensão, as circunstâncias pessoais e sociais, a conduta e os antecedentes do usuário. Como já foi mencionado, a próxima seção falará sobre a Cannabis Sativa, com o objetivo de trazer evidências científicas sobre as consequências do seu uso. Esse entendimento é relevante justamente para refletir sobre as políticas atuais relativas as drogas, refletir sobre o debate prólegalização que parece ignorar os danos causados aos usuários, e refletir sobre porque a apologia da droga, droga esta que causa tantos malefícios, pode ser tão prejudicial para a população. Inicialmente a seção irá abordar o conceito de drogas, para depois se aprofundar na Cannabis Sativa, falando sobre a espécie da planta, seus ativos, as consequências do uso, o uso medicinal, seus malefícios e sua relação com o vício.
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IMG_20160507_240234535 2 CANNABIS SATIVA
2.1 Conceito de Drogas
O termo droga tem origem na palavra drogg, proveniente do holandês antigo e cujo significado é folha seca. Esta denominação é devido ao fato de, antigamente, quase todos os medicamentos utilizarem vegetais em sua composição. Atualmente, porém, o termo droga, segundo a definição da Organização Mundial de Saúde – OMS, abrange qualquer substância não produzida pelo organismo que tem a propriedade de atuar sobre um ou mais de seus sistemas produzindo alterações em seu funcionamento (SENAD, 2008). Consequentemente, tanto é droga a maconha quanto a aspirina e o antibiótico; tanto o álcool quanto a cocaína; tanto o cigarro quanto LSD; tanto o cafézinho quanto o lança-perfume. O que varia é como atua no organismo de cada indivíduo, bem como a finalidade, pois, quando a droga é empregada com finalidade terapêutica, ela passa a denominar-se medicamento. Porém, existe uma grande variedade de definições equivocadas que permeiam o assunto “drogas” e confundem a população leiga acarretando um agravamento dos preconceitos e dificultando a implantação de medidas preventivas. (SCHENKER; MINAYO, 2004) Conceituar droga, através do senso comum, não é nada efetivo. Muitos lançariam mão do critério legal para chegar a uma conclusão, usando como argumento “aquilo que é proibido por lei é droga”. Nessa classificação, o álcool e o cigarro seriam desconsiderados como tal. Outros ainda diriam que pela maconha ser “natural” não seria droga, partindo do falso pressuposto que droga é composto químico manipulado pelo homem. (ARAÚJO, 2008) O uso abusivo da maconha entre adolescentes dos países desenvolvidos vem aumentando significativamente nas últimas décadas. Uma das possíveis explicações para esse fato é a percepção de que a maconha é uma“droga leve”, sem muitas consequências para a saúde do indivíduo, em contraste com outras drogas ilícitas. (id., ibid.) Alguns países como a Holanda, Inglaterra, Suíça e Portugal, bem como alguns estados da Austrália e do Canadá, adotaram passos na política de diminuir as penalidades para a posse de maconha. Esses movimentos estão sendo interpretados por muitas pessoas, especialmente os jovens, como dando luz verde ao uso da maconha. Alguns vêem essa tendência como uma aceitação do inevitável e os estudos nos últimos 15 anos reiteraram que a maconha constitui-se agora como parte do horizonte de lazer para os jovens, não possuindo mais a mística da proibição. Tanto é assim que muitos vêem a maconha como uma droga benigna, se é que a consideram uma droga. (ARAÚJO, 2008) Segundo Marlatt (1999), as drogas são classificadas em dois grandes grupos: Psicotrópicas e

Чужой против Хищника
Чужой против Хищника

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Psicogênicas. Para sustentar esta monografia a revisão da literatura estará voltada para as drogas psicotrópicas seguida da especificação da maconha. As drogas psicotrópicas são aquelas substâncias que são atrativas por atuarem no cérebro, modificando a maneira de sentir, de pensar e, muitas vezes, de agir. Agem principalmente no sistema nervoso central alterando as funções cerebrais e mudando temporariamente a percepção, o humor, a consciência, o comportamento. Dependendo da ação no cérebro, as drogas psicotrópicas podem ser divididas em três grandes grupos: as depressoras, as estimulantes e as perturbadoras. Nesse último grupo se situa a maconha. As perturbadoras ou alucinógenas fazem com que o cérebro passe a funcionar fora do seu normal, ou seja, a pessoa fica com a mente perturbada. As principais drogas desse grupo são: as de origem vegetal; Mescalina, THC (maconha), Psilobicina,lírio. De origem animal; LSD-25, ecstasy, anticolinergicos . Sobre a discussão acerca das drogas, Carlini (2002) argumenta que a temática drogas é algo que se insere nos mais diversos interesses, sejam eles econômicos, políticos e sociais; e que muitos países que participam dos acordos e discussões que foram implementadas durante convenções, atuam de forma negligente, em favor dos seus interesses. Tudo isso torna cada vez mais difícil de por em prática um programa eficaz acerca do uso das drogas.
maxresdefault2.2 Cannabis Sativa – sobre a planta
A Cannabis Sativa é uma planta originária da Ásia Central que se adapta facilmente em locais de clima quente e seco e com certa umidade no solo. A palavra “maconha” seria um anagrama da palavra “cânhamo”. (CARLINI, 2006) Dependendo de onde e como é cultivada, e de como foi ingerida, pode apresentar alterações na concentração de suas propriedades psicoativas. Seu nome cientifico é Cannabis Sativa, onde Cannabis diz respeito ao gênero da planta e é o correspondente em latim para cânhamo. Sativa se refere a como ela é plantada e semeada, e indica a espécie da planta. (BERGERET & LEBLANC, 1991) São três as espécies da maconha, além da Sativa, temos a Cannabis Ruralis, que não possui ingredientes psicoativos, e a Cannabis Índica, que possui baixo teor de THC. (INABA & COHEN, 1991) O THC, seu ativo mais importante, foi isolado pela primeira vez em 1964 por Raphael Merchoulin, Yechrel Gaoni e Habib Edery, ao extraí-lo a partir do haxixe com éter de petróleo, seguido de repetidas cromatografias. O THC (delta-9-tetrahidrocanabinol) é um dos 60
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canabinóides presentes na planta e é o responsável pelos efeitos psicoativos, sendo que sua concentração é o que determina a potência de seu efeito.Quando ingerido em altas doses, pode-se constatar uma adaptação aos efeitos do THC, tanto mentais quanto físicos, sendo a dependência psíquica a mais constante. (BERGERET & LEBLANC, 1991) Sua absorção é feita pelos pulmões e passa para a corrente sanguínea, atingindo pico de concentração após 10 minutos depois de ter sido inalada. O seu declínio é igualmente rápido ficando muito baixo o nível de concentração após uma hora de uso, devido ao rápido metabolismo e a distribuição no cérebro e as outras estruturas do organismo. Já se tivesse sido ingerido oralmente seus efeitos poderiam durar uma hora ou mais e permanecer por até cinco horas. ( LARANJEIRA et al, 2004) No que concerne à forma de utilização da maconha, geralmente faz-se a secagem e a trituração de suas folhas e flores na forma natural. Pode-se utilizá-la também através da resina em forma de placas, ou bastões chamados de haxixe, e também como óleo, obtido das flores do da planta. (BERGERET & LEBLANC, 1991; COSTA & GONTIÈS, 1997) Para Kalina (1986), é o uso que confere à substância o status de droga. É importante, portanto, conhecer as consequências do seu uso, como será exposto no próximo subcapítulo.
2.3 Consequências do uso
Morte figura ambígua De acordo com o DSM IV (2002) a maconha esta entre as primeiras drogas usadas pelos jovens na fase da adolescência. Seus transtornos ocorrem mais frequentemente em homens, como ocorre com a maioria das outras drogas, com maior prevalência na faixa dos 18 aos 30 anos. É a substância ilícita mais utilizada no mundo, consumida desde a antiguidade tanto por seus efeitos psicoativos como medicinais. (LARANJEIRA et al, 2004) Desta forma, a maconha tem sido usada para finalidades religiosas, artísticas e recreativas em diferentes tempos e culturas. Seus efeitos mentais, embora não sejam normalmente estudados pelo valor clínico; produzem estados de relaxamento físico e psíquico. No entanto, os cabinóides presentes na maconha alteram a percepção sensorial e temporal, tornam o raciocínio veloz e prejudicam o processamento da memória de curto prazo. Todos esses efeitos parecem ser transitórios, desaparecendo com a descontinuação do uso da droga. (MALCHER-LOPES; RIBEIRO, 2008) Sonenreich (1982), apresenta uma das primeiras publicações psiquiátricas acerca da maconha, composta de oito fenômenos psicológicos observados em usuários da Cannabis propostos por Moreau de Tours (1845), quais sejam: 1) Sentimentos de felicidade; 2) Excitação, dissociação de idéias; 3) Enganos na avaliação do tempo e do espaço; 4) Aumento de sensibilidade auditiva; 5)
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Idéias fixas, convicções delirantes; 6) Lesões dos afetos; 7) Impulsos irresistíveis; 8) Ilusões e alucinações. Segundo Bergeret e Leblanc (1991), a embriaguez canábica dá-se em quatro fases: 1) fase de bem-estar eufórico; 2)fase de hiperestesia sensorial, com perturbação dos dados espaço-temporais e euforia ou rapto ansioso; 3) fase extática e 4) fase do sono e desperta. O principal motivo do uso indiscriminado da maconha então é a sensação que ela proporciona aos seus usuários como estado alterado de consciência, euforia, disforia, alteração na percepção do tempo, perda de controle motor, alteração nas funções sensoriais simples, como comer, ver TV, e ter relações sexuais. Porém, nem todos os seus efeitos são agradáveis podendo causar crises de ansiedade, ataque de pânico e alucinação ate mesmo em usuários mais experientes. (LARANJEIRA et al, 2004)
97e42e909f 2.4 Uso medicinal
Drogas quando aplicadas com fins terapêuticos, passam a ser denominadas como medicamento (SENAD, 2008). O uso medicinal da maconha é aceito em diversos países, porém a polêmica ainda é grande, pois acaba sendo um dos argumentos pró-legalização por parte dos ativistas, mesmo que em sua grande maioria façam uso recreativo e não terapêutico da mesma. (ARAÚJO, 2008 Um dos efeitos do uso da maconha é a hiperemia conjuntival com queda da pressão intraocular, e por esse motivo o THC foi indicado para o tratamento de glaucoma. É também utilizado para alívio de náuseas, com indicação para pacientes em tratamentos quimioterápicos. (INABA & COHEN, 1991) No sistema respiratório tem efeitos positivos e negativos, o THC age como um bronco dilatador e por esta razão alivia os sintomas em indivíduos com asma, porém seu uso crônico diminui o tamanho da passagem de ar nos pulmões causando asma. (FIGLIE, BORDIN e LARANJEIRA, 2004) Estudos na área querem extrair o benefício dos canabinóides sem os efeitos colaterais que resultam do fumo da maconha, como a perda de memória, por exemplo. O desenvolvimento de medicamentos que maximizem as propriedades terapêuticas da droga é encorajado, sem seus efeitos danosos. A próxima seção abordará, portanto, os malefícios do uso da droga.
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272253_2251948101975_3738552_o 2.5 Malefícios
Apesar das alterações cerebrais relacionadas ao uso da maconha serem mais sutis que as alterações determinadas por outras drogas, não significa que elas não existam e não sejam relevantes. (JUNGERMAN et al, 2005) Sobre a hipótese da maconha causar esquizofrenia e quadros psicóticos, F. Jungerman (ibid.) afirma que só ela nao é suficiente para tal ocorrência, mas é um componente causal que interage com outros componentes causais, tais como genótipo, condições ambientais e de neurodesenvolvimento. Vários estudos mostram que a maconha pode produzir alterações cognitivas; usuários crônicos apresentam déficits em várias áreas, incluindo aprendizado verbal, memória de curto prazo, atenção e funções executivas. O impacto cognitivo é maior quanto mais precoce e maior a duração do uso. Esse tema é particularmente importante para profissionais de saúde mental, pois os maiores prejuízos relacionados ao uso da maconha são os transtornos mentais que acabam sendo relacionados ao seu consumo. (id., ibid.) A Cannabis Sativa compromete a memória de curto prazo e os fumantes crônicos demonstram apatia e falta de motivação. Inaba e Cohen (1991) ainda mencionam que os efeitos dos alucinógenos dependem particularmente da dose, da estrutura emocional do usuário, do seu estado de ânimo por ocasião do uso e das circunstâncias que os rodeiam. Ainda não está claro se as alterações cognitivas melhoram com a abstinência prolongada e são necessários estudos maiores investigando a irreversibilidade dos déficits neuropsicológicos associados ao uso prolongado desta substância. O uso da maconha geralmente é intermitente e limitado; no entanto, estima-se que 10% dos que experimentaram maconha tornam-se usuários diários e 20 a NOIVA-279x30030% a consomem semanalmente. Dados da Austrália mostram que os indivíduos têm iniciado o uso bem mais cedo e a concentração de delta9-tetrahidrocanabinol (THC, principal substância psicoativa presente na maconha) está 30% maior do que há 20 anos atrás. (id., op. Cit.) A partir de estudos com o THC, foi descoberto o sistema endocanabinóide humano. Receptores cerebrais e neuromoduladores têm um papel importante na fisiologia cerebral regulando diversos sistemas neurotransmissores, tais como: dopaminérgico, serotonérgico, colinérgico, glutamatérgico e gabaérgico. Estudos com animais mostram que o uso crônico de THC determina um desbalanço no sistema endocanabinóide e, por consequência, alterações nos diversos sistemas neurotransmissores. (id., ibid.) Entre os efeitos físicos da maconha, existem evidências que ela pode ser altamente carcinogênica. Os canabinóides prejudicam a imunidade das células, e as outras substâncias prejudicam os alvéolos. O uso da maconha aumenta bastante o trabalho cardiovascular de indivíduos normais induzindo-os a taquicardias, ou seja, logo após a ingestão o coração dispara para
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160 batidas por minuto, e isso pode causar problemas cardiovasculares. No sistema reprodutor a maconha aumenta a vaso dilatação nos genitais e retarda a ejaculação. Além disso, ingerida em altas doses leva a diminuição da libido e a impotência, possivelmente em decorrência da diminuição da testosterona. (LARANJEIRA et al, 2004). Alguns autores dizem que a maconha não causa dependência química pois não causaria abstinência. Kalina (1986), se posiciona dizendo que há uma abstinência sim, encoberta pelo uso excessivo de cigarros e pelo ato compulsivo de comer. Disserta ainda sobre a abolia, que seria a falta de motivação, causada pela maconha. Não se sabe se a abolia leva ao consumo, mas o contrário acontece, podendo o usuário entrar num círculo vicioso, numa espécie de condicionamento recíproco. Estudos da neurociência sustentam que as substâncias de abuso, tais como a cannabis sativa, viciam através da sua ação no sistema de recompensa cerebral (SRC), que será melhor abordado na seção seguinte. Quanto maior é a ativação do sistema de recompensa, maior é o prazer obtido depois do feito, maior será o prazer antecipado só de pensar no que se considera fazer e, portanto, maior será a probabilidade de fazer aquilo de novo. Porém, no caso desta ativação através da droga, o sistema cria tolerância e exige mais doses e maior frequência do uso da droga, gerando cada vez menos prazer. (HERCULANO-HOUZEL, 2005)
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13 SISTEMA DE RECOMPENSAS E NEUROPLASTICIDADE
A capacidade motivacional para explorar, observar, experimentar e conhecer, faz parte de um conjunto de circuitos e estruturas neuronais desenvolvidos ao longo da evolução das espécies que regulam a busca e obtenção de recompensas no ambiente. Buscar recompensas faz parte de uma programação de nosso cérebro; somos movidos, ou melhor, motivados a sentir uma sensação interna de bem-estar e de prazer. (HERCULANO-HOUZEL, 2005) Os prazeres básicos estão a serviço da preservação da vida, desde a obtenção de alimento, água, abrigo, parceiro para copulação até a proteção dos filhos. Contudo, esses são exemplos de prazeres que nos recompensam com uma satisfação mais primordial. Outras recompensas como receber uma boa nota em uma prova, receber elogios, ouvir sua música favorita, ou mesmo assistir um bom filme de comédia são exemplos de situações que podem ativar o Sistema de Recompensas Cerebral (SRC). Ativar o SRC significa mapear o meio ambiente para encontrar satisfação em qualquer situação ou atividade que forneça prazer.(id.ibid.)
3.1 Sistema de Recompensas Cerebral
S. H. HERCULANO-HOUZEL (2005) pondera que o Sistema de Recompensa Cerebral (SRC) pode ter servido originalmente como um modo de garantir que comportamentos elementares para sobrevivência e reprodução dos mamíferos fossem repetidos e lembrados. Com a evolução, o SRC nos possibilitou buscar satisfações de ordem cognitiva, passamos a ter cada vez mais prazer com a obtenção de conhecimento intelectual. Ao mesmo tempo, também nos capacitamos melhor para evitar castigos, punições e repressões que geram sensações opostas ao prazer e ao bem-estar. Em síntese, o sistema de recompensa do cérebro é o conjunto de estruturas que nos premiam com uma sensação de prazer e nos fazem querer mais daquilo que faz com que esse prazer seja novamente ativado. A droga, quando gera prazer, fará com que o usuário faça uma nova busca por ela, e com isso, o vício poderá se estabelecer. (id.ibid.) Dentre as estruturas deste sistema cerebral se destacam a área tegmentar ventral e o núcleo acumbente. Há dois tipos de informações que são tratados pela área tegmentar. O primeiro grupo de informações corresponde aos dados dos cinco sentidos sobre o que está ocorrendo com o corpo quando na presença de um potencial estímulo de prazer; o segundo tipo de informação é fornecido pelo córtex pré-frontal, e diz respeito às intenções que estão subjacentes ao comportamento do momento. Os neurônios nesta área liberam dopamina para os neurônios do núcleo acumbente quando detectam algo interessante, novo ou surpreendente em relação ao comportamento do momento. O comportamento recebe influência direta do núcleo acumbente devido à sua
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comunicação com o córtex pré-frontal. O córtex pré- frontal participa de nossa capacidade de tomadas de decisões. Ainda, o núcleo acumbente ativado pela dopamina modifica a atividade dos núcleos da base, regiões responsáveis pela continuidade de um comportamento.(id.ibid.) A Cannabis Sativa age diretamente sobre esse sistema, aumentando a quantidade de dopamina disponível para ativá-lo. A dopamina encontrada nessa ativação pode ser até dez vezes maior do que a encontrada pela ativação de prazeres cotidianos, como beber um copo d’água gelado quando se está com muita sede, por exemplo.(id.ibid.) A dopamina é um neurotransmissor, isto é, uma substância que afeta a atividade elétrica dos neurônios receptores desse neuromodulador. Quanto mais os neurônios do núcleo acumbente recebem dopamina, maior é sua ativação (atividade elétrico-química) e, consequentemente, maior é a sensação de prazer e satisfação resultante do comportamento recentemente reconhecido como satisfatório pelo SRC.(id.ibid.) O esforço para conseguir cada vez mais droga, que gera cada vez menos efeito, o que caracteriza o vício, pode ser explicado pela hipótese da alostase hedônica, que se refere a alteração crônica do ponto de equilíbrio do mecanismo de recompensa do cérebro. Essa alteração leva tanto à tolerância à droga (surtindo menos efeito quando consumida) quanto à busca obsessiva por uma nova dose. Ou seja, com o uso contínuo da droga o sistema fica acostumado (desenvole tolerância) e exige mais experiências com a droga, mais doses numa maior frequência, na tentativa de obter o prazer das primeiras experiências.(id.,ibid.)
308098_308754495808058_284284534_n 3.2 Neuroplasticidade
A plasticidade cerebral se refere a alterações na estrutura do cérebro que acompanham a experiência. Esse termo sugere que o cérebro é maleável, como o plástico, e pode ser moldado em diferentes formas. Hoje se sabe que o cérebro não se torna uma estrutura fixa, pouco passível de modificações, e sim se tranforma ao longo de todo o ciclo vital. Os cérebros, expostos a diferentes experiências ambientais, são moldados de forma diferente. (DALGALARRONDO, 2008) A plasticidade neuronal é verificada pelo nascimento de novos neurônios (neurogênese), pelo aumento ou pela redução no tamanho dos dendritos e das espinhas dendríticas, pela formação ou eliminação de sinapses, pelo aumento da atividade glial e pelas alterações na atividade metabólica de distintas áreas. (id.,ibid.) Vinculados a experiência, o aprendizado e a memória estão associados a modificações sinápticas. Um exemplo disso são as modificações neuronais verificadas no cérebro de músicos profissionais, como por exemplo os violinistas, cujas representações neuronais de suas polpas digitais no córtex tornam-se após longos anos de aprendizado com o instrumento musical, muito
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mais extensas e completas que em pessos sem tal experiência. No entanto, existem também as experiências negativas, como por exemplo episódios repetidos de depressão e ansiedade, que foram associados com a redução do volume do hipocampo e do córtex. Postula-se ainda uma plasticidade mal-adaptativa relacionada a origem de condições como esquizofrenia, autismo, e transtorno de estresse pós-traumático. (ROSSA, 2012) Assim, as drogas de abuso, como a Cannabis Sativa, ativam o sistema de recompensa cerebral constituindo um sequestro farmacológico das funções normais de recompensa cerebral (por constituírem estímulos mais potentes), usurpam os mecanismos de regulação motivacional/recompensa conduzindo a comportamentos de busca e uso de drogas. A modulação da plasticidade sináptica a longo prazo nos circuitos envolvidos constitui uma forma de as consequências comportamentais serem reforçadas, por usurpação dos mecanismos de aprendizagem normais, constituindo processos de aprendizagem anormais e cimentando respostas comportamentais relacionadas ao comportamento de busca. Alguns indivíduos progridem para uma aprendizagem baseada em hábitos (habit-based learning), suficientemente forte a ponto de persistir perante evidência de consequências pessoais adversas, apesar do conhecimento e reconhecimento do malefício que a droga causa e pode causar a si mesmo. (COSTA et al, 2008) A dopamina tem um papel na otimização da aprendizagem associativa dos comportamentos reforçados, pela influência sobre a excitabilidade sináptica e facilitação de plasticidade sináptica. O circuito do prazer medeia as alterações neuronais iniciadas pelas drogas de abuso, por sobreativação dos mecanismos de recompensa e sensibilização comportamental a exposições repetitivas.Em termos gerais, as drogas de abuso ativam o circuito do prazer por meio dos neurônios dopaminérgicos , por ação direta nos terminais dopaminérgicos ou indiretamente sob os inputs (informação/estímulos) modulatórios. (ROSSA, 2012) Pôde-se perceber ao longo desta seção a importância de rever os conhecimentos sobre o substrato neuroanatômico, descrever os mecanismos de neuroplasticidade para poder relacioná-los com a neurobiologia dos transtornos por uso de Cannabis Sativa (abuso e dependência). Estas evidências trazem ainda mais consistência para o fato do uso da maconha causar vício. O capítulo seguinte irá abordar outros fatores que podem levar a dependência, de ordem social, cultural e individual, mostrando de que maneira as mensagens relativas à Cannabis Sativa e propagadas pela mídia podem causar implicações e funcionar como indutores do uso.
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4 O PODER DAS MENSAGENS
O principal objetivo desta monografia é mostrar a relevância de estudar os meios de comunicação e suas implicações entre o uso da maconha e suas representações sociais, levando em consideração processos como as mensagens subliminares que, como se tentará demonstrar, acabam fazendo uma apologia (e há uma seção sobre este conceito), através do cinema. Vale ressaltar que embora o foco seja o cinema, também no teatro o orientador desta monografia declarou-se estupefato com a quantidade de peças teatrais que tem visto e que introduzem o tema da Cannabis Sativa, a maconha, de forma associada a um humor saudável, a uma banalização e generalização do seu uso (“não faz mal, todo mundo usa”, sugerem alguns diálogos de peças teatrais variadas). É importante demonstrar como as mensagens propagadas pelos filmes podem influenciar o público, discorrendo sobre cada uma das teorias nos subcapítulos que seguem. O subcapítulo 5.1 abordará a teoria das Representações Sociais, o subcapítulo seguinte, 5. 2, apresentará o processo da percepção subliminar e o experimento de priming semântico, o subcapítulo 5. 3 fará uma análise do conceito da apologia e, ao fim, no subcapítulo 5.4, a seção trará um breve levantamento sobre os efeitos da apologia das bebidas alcoólicas e dos cigarros, no cinema e na publicidade, na literatura.
4.1 Representações Sociais
Para Moscovici (2003), toda representação é construída na relação do sujeito com o objeto representado, não existindo representação sem objeto. Desse modo, uma representação social não pode ser compreendida enquanto processo cognitivo individual, uma vez que é reproduzida no intercâmbio das relações e comunicações sociais. Esse autor ainda observa que o objeto – seja ele humano, social, material ou uma idéia – será apreendido através da comunicação. Assim, a representação social da maconha e sucessivamente do seu uso, que faz parte do cotidiano social, recebe significados em conformidade com os grupos de pertença e o contexto social no qual se encontram inseridos. (COUTINHO, ARAÚJO, GONTIÈS, 20040 Esses significados são resultantes da interação entre o senso comum e o conhecimento erudito, na qual existe uma relação de influência mútua e permanente entre estes dois universos, resultando numa diversidade de significados que circulam através dos meios de comunicação formais e informais, assimilados e reelaborados socialmente. Considerando os filmes de cinema como um meio de comunicação difusor de informações, seu conteúdo tanto pode servir como material para contribuir com a significação do objeto, como ele próprio já demonstra uma representação social do tema, sendo que o autor do filme e sua equipe
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são também atores sociais reproduzindo significações. O mesmo se aplicaria nas peças teatrais, mas como já foi colocado, esta monografia irá focalizar basicamente alguns filmes da arte cinematográfica. (OLIVEIRA, 2006) Entende-se, assim, que, ao representar a maconha, o filme não simplesmente a produz, mas a reconstrói, levando essa modificação como marca de sua passagem pelo psiquismo individual e coletivo. (GONTIÈS et al, 2004) Ou seja, essa população conhece a maconha por meio das conversas cotidianas, conselhos, contato com mídia preventiva e com a mídia em geral, como filmes, sites da internet, revistas. Essa forma de conhecimento não especializado, do senso comum, é o que caracteriza o fenômeno das representações sociais da maconha, fator intimamente ligado à vida social. Nesse contexto, as representações que os adolescentes, os jovens e os adultos constroem acerca da maconha são imersas nesse movimento de mensagens, organizado cognitivamente conforme as diferentes modalidades de comunicação. (COUTINHO et al, 2004) É importante considerar, também, que o conhecimento sobre o uso da maconha é alcançado de duas maneiras: pela experiência individual e direta ou pela experiência coletiva mediada pelos grupos sociais. No caso da maconha, tanto o primeiro quanto o segundo modo são comuns. Contudo vale salientar que Moscovici (1981) não se refere à representação como uma reprodução estática, mas compreende que o ato de representar é responsável por inúmeras 373888_308754752474699_173155458_ntransformações entre o que é externo e o que a ele é devolvido. Dito de outra forma, considera-se a representação social como o sentido atribuído a um dado objeto pelo sujeito do senso comum, a partir das informações adquiridas na prática e nas suas relações cotidianas. (MARKOVÁ, 2006) Sua construção acontece, assim, a partir da elaboração de informações de diferentes ordens, que são continuamente transformadas, recriadas, articulando instâncias, níveis e dimensões. (MADEIRA, 2001) Portanto, por meio dos meios de comunicação como um todo, propagam-se mensagens sobre essa substância psicoativa, influenciando, assim, o processo de escolha do indivíduo. Evitá-la ou consumi-la depende do complexo processo de interação entre componentes genéticos, a história do indivíduo e a sua percepção da representação social do objeto, ou seja, a maconha. Porém, nem sempre essas mensagens provém de dados científicos ou são transmitidas de maneira isenta de interesses secundários ou mesmo de forma clara, direta e consciente em relação aos perigos apresentados pela Cannabis Sativa. Em função disto, sabendo-se que toda comunicação apresenta aspectos verbais e nãoverbais, e que podem existir componentes subliminares nas mensagens, o próximo subcapítulo irá tratar da percepção subliminar.
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4.2 Percepção Subliminar e Priming Semântico
Por definição, subliminares são as mensagens que nos são enviadas dissimuladamente, ocultas, abaixo dos limites da nossa percepção consciente, podendo influenciar nossas escolhas, atitudes e motivar a tomada de decisões posteriores. A manipulação subliminar fere a liberdade de escolha e autonomia do público. (CALAZANS, 1992). O. Poetzle (apud CALAZANS, ibid., p.72), desenvolveu em 1919 uma teoria complexa sobre o conteúdo dos sonhos. Segundo ele, os sonhos são feitos de material subliminar captado durante a vigília, e a este processo inicial Poetzle deu o nome de Lei de Exclusão. Ou seja, todo material não selecionado pela mente consciente iria servir de material para os sonhos. Revela também em seus estudos que as sugestões pós-hipnóticas têm o mesmo resultado prático dos estímulos subliminares para alterar o comportamento humano. C.G.Jung (apud CALAZANS, ibid., p.28), diz que a consciência é como um holofote; o que não está iluminado pela luz da consciência e da razão seria o fundo, fora de foco, inconsciente e subliminar. Todo nosso Inconsciente Pessoal, que guarda nossas experiências pessoais na memória inconsciente, é composto de percepções subliminares não-conscientes, que são a base de toda espécie de intuição e consiste no que Jung chama de Sombra. Nesse sentido, também a psicologia da Gestalt coloca que a percepção humana seleciona como mais importante é chamado de figura, enquanto o que fica em segundo ou terceiro plano é o fundo. Logo, tanto a escola da Gestalt quanto C.G. Jung parecem alertas para mensagens ou estímulos que são captados conscientemente e para outros captados subliminarmente.(id., ibid) Como sustenta W. B. Key (apud CALAZANS, ibid., p.48), fisiologicamente o olho humano possui células chamadas bastonetes, que formam a visão periférica, e outras chamadas cones, que constituem a fóvea, nosso foco de visão consciente. Em geral, a visão periférica se situa como fundo na percepção, porém, pode passar para figura no momento em que é percebida, alternando a relação figura-fundo. Não só a visão é 308882_308754675808040_1226154801_nresponsável nessa relação, embora muito importante. Os outros sentidos, como a audição por exemplo, também fazem parte do processo. O fundo musical, que dá o ”clima” ao anúncio publicitário ou filme de terror, por exemplo, é subliminar enquanto você estiver focalizando atento a fala e os gestos do ator-personagem. Quando assistimos a um filme, nosso foco de interesse, nossa figura é o filme. Caso alguém ao longe esteja tocando um disco de música popular, a música acaba sendo o fundo, pois não está no foco de interesse do indivíduo. Neste caso, a música é captada subliminarmente. Poderia ser o contrário: quem está tocando o disco de música popular tem a música como sua figura, e o filme acaba ficando de fundo. Aqui, portanto, subliminar seria o filme. (id., ibid.) As mensagens subliminares para serem percebidas visualmente, usam recursos de letras,
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imagens e cor. Por exemplo, temos todas as mensagens visuais transmitidas pelos meios de comunicação de massa: televisão, cinema, vídeo, computador, vitrines de loja, palanques de políticos, palcos de teatro, neons, cartazes de rua, fotografias (os jornais usam este recurso), desenhos, pinturas, panfletos, revistas, jornais, livros, histórias em quadrinhos ou todo e qualquer estímulo captado pela retina. (id., ibid.) Da mesma forma, há subliminares endereçados ao ouvido, que podem ser captados no cinema através da fala, do áudio, da trilha sonora e dos seus impactos gerados pela saída e tratamento específico do som das caixas que geram a sensação do público estar inserido dentro do acontecimento da cena do filme, dando sensação de tridimensionalidade ao som. Fora dos filmes, os apelos subliminares também podem ser captados através do rádio, televisão, vídeo, teatro, no consultório médico, nos palanques políticos (o ministro da Propaganda de Hitler, Goebbels, usou esta técnica) e até mesmo quando fazemos compras no supermercado e andamos ou dirigimos pela rua. (id., ibid.) Há também subliminares para a pele, o nariz e a língua. Mensagens táteis seriam, por exemplo, o tipo de papel usado em impressos (como mala-direta) e o material das embalagens. Tintas empregadas nos impressos, perfumes aspergidos na platéia do teatro e em palanques políticos são capazes de estimular nosso sentido olfativo subliminarmente. Por outro lado, certas substâncias empregadas em alimentos, pastas de dente e cigarros, para nos dar a ilusão de certos sabores, também são subliminares. (id., ibid.) Existem ainda as inserções em frames não perceptíveis a olho nu, que estariam no fundo, como no Experimento Vicarista. Jim Vicary (1956) colocou num cinema de New Jersey um segundo projetor, o taquicoscópio,  seminrio-prof-dra-daniela-barros-57-728 projetando numa velocidade de 1/3000 de segundo o slide “Drink Coke” (Beba Coca-Cola) sobre os fotogramas do filme Picnic. Então, ele teria medido a diferença percentual na reação dos dois grupos, aquele que esteve presente nas sessões de “projeção subliminar”, e o grupo que não sofreu exposição. As frases escolhidas foram “Drink Coke” (beba coca-cola) e “Eat Popcorn” (coma pipoca), e foram apresentadas em noites alternadas. Segundo os seus resultados, nas noites em que as frases foram projetadas as vendas de pipoca aumentaram em 57,7%, e as vendas de Coca-Cola em 18,1%. A experiência foi relatada na revista Advertising Age (Vol 37, pág. 127, 16/Setembro/1957 apud CALAZANS, op. cit e p 89). Nos anos 70, a tecnologia subliminar foi adaptada à mídia televisão em um frame (quadro) (1/30 de segundo) no jogo infantil Kusher Du, obtendo ótimos resultados, e a partir desse momento, passou a ser usada sem nenhuma lei que regulamentasse. Mais tarde, o professor V. Packard, lançou a obra “Os persuasores ocultos”, criticando o uso da tecnologia subliminar, afirmava em seu livro que essa tecnologia tirava a liberdade de escolha do indivíduo, já que ele era incapaz de ver a mensagem “Beba Coca” durante o filme, devido à alta velocidade em que era mostrada. A obra de
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Vance Packard acabou transformando a tecnologia subliminar num mito, num tabu, e desencadeia até hoje grande polêmica sobre o assunto. Em consequência desta obra, ainda, a Comissão Federal de Mercado norte-americana passou a proibir o emprego de tecnologias baseadas na velocidade taquicoscópica de Jim Vicary nos meios de comunicação de massa dos Estados Unidos. No entanto, não só o fato da velocidade de um estímulo estar abaixo do limiar da percepção constitui o processo das mensagens subliminares como um todo. O fato de você associar imagens de fundo, por exemplo, a uma outra imagem, pode “contaminar” a imagem em primeiro plano. Como por exemplo, em alguns filmes analisados podese ver cenas em que a maconha aparece ao fundo e em primeiro plano, um cena de sexo prazerosa. Ainda relativo às mensagens subliminares, uma técnica bem utilizada no Brasil pela publicidade é o merchandising. A técnica consiste em mostrar um produto ou serviço (como perfumes, carros, roupas) durante as situações dramáticas, inserido na narrativa de modo aparentemente inocente e inofensivo. Atores fazem o comercial subliminar, falando bem do produto ou mostrando-o em situações convenientes. A Agência Apoio, filial da Rede Globo, foi criada especialmente para tratar do merchandising nas novelas globais. (id., ibid.) Um experimento realizado por  Algumas pessoas nunca enlouquecem Que vida de MERDA elas devem ter Charles Bukowski frase Kelley et al, 2002 (apud HERCULANO-HOUZEL, 2005) mostrou que a inserção das gargalhadas gravadas durante a apresentação de uma série de televisão de comédia, facilita a risada e o entendimento da piada por parte do público, fazendo com que este público ria mais por essa inserção do que pelo entendimento das situações de um episódio. Outro experimento que sustenta a teoria da percepção subliminar é a do priming semântico. O priming é um efeito experimental que se refere à influência que um evento antecedente (prime) tem sobre o desempenho de um evento posterior (alvo), ou seja, se caracteriza por essa pré-ativação, uma informação que pode ter efeito sobre este evento posterior. Em outras palavras, pode-se dizer que, nesse método, supõe-se que, por exemplo, uma palavra possa ser acessada mais rapidamente se precedida por outra palavra com a qual ela partilhe características semânticas (médico/hospital), fonológicas (hora/oca), ou morfológicas (dança/dançarino). (FRANÇA et al, 2005). Essa pré-ativação pode ainda ser compreendida como um aumento na velocidade ou precisão de uma decisão que acontece como consequência de uma exposição anterior a alguma informação relevante para a decisão, sem qualquer intenção ou tarefa ligada à motivação. Ela poderá ser apresentada em forma de estímulos com exposição suficiente para a percepção em nível consciente como pré-ativação supraliminar ou em exposição insuficiente para a percepção da consciência como a pré-ativação subliminar. (id.,ibid.) O efeito de priming pode ser alcançado tanto por meio de estímulos linguísticos como pela apresentação de figuras, filmes, ou, ainda, de estímulos auditivos. O priming que utiliza mais de um tipo de modalidade de estímulo para sua realização, por exemplo, a auditiva e a linguística, é
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denominado cross-modal priming, também conhecido como priming multimodal. (FRANÇA et al, 2005) Todas essas mensagens perbebidas em nível subliminar, podendo implicar nas decisões tomadas pelo público espectador dos filmes relativas ao uso da droga Cannabis Sativa , podem estar promovendo apologia da droga. A medida que uma cena, que antecipa uma outra cena em que o uso da substância aparece, pode implicar relações de significados entre a maconha e algo favorável e isento de perigos relativos ao seu uso. Em função disso, o próximo capítulo abordará o conceito de apologia.
3. divisao SNC 4.3 Apologia – da análise do conceito
É de domínio comum o sentido da palavra “apologia”. Quando Platão produz a “Apologia de Sócrates”, pode-se entender que, reproduzindo a defesa que Sócrates fez de si mesmo, faz seu louvor, seu elogio, reconhece e realça-lhe os méritos. Apologia, também conforme o dicionário Aurélio, é “discurso para justificar, defender ou louvar, ou encômio, louvor, elogio”. (ARAÚJO, 2008) No verbete elaborado para o Dicionário de Política organizado por Norberto Bobbio e outros (apud ARAÚJO, 2008), Giácomo Sani define propaganda como difusão deliberada e sistemática de mensagens destinadas a um determinado auditório, visando a criar uma imagem positiva ou negativa de determinados fenômenos (pessoas, movimentos, acontecimentos, instituições, etc) e a estimular determinados comportamentos. Diz ainda que em suas acepções mais correntes, a Propaganda difere de outras formas de persuasão, enquanto realça elementos puramente emotivos, recorre a estereótipos, põe em relevo só certos aspectos da questão, revela um caráter sectário. No momento que um meio de comunicação propaga, com exclusiva e tendenciosa ênfase os benefícios do consumo recreativo da maconha ou quando tenta desmistificar seus malefícios, ou quando simplesmente os ignora, colocando em evidência só certos aspectos da questão, louva, defende e elogia, está fazendo apologia da droga. (ARAÚJO, 2008) No Brasil, o delito previsto no art. 12, § 2º, III, da Lei 6368/76 – batizado popularmente por apologia a drogas, diz que é crime incentivar, fazer a publicidade, divulgar drogas ilícitas. A Lei 11.343/06 estabelece pena de um a três anos de prisão para quem: induzir,instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga. Já o Código Penal, prevê detenção de três a seis meses para quem fizer publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime. Portanto, o que se pretende com esta seção sobre a análise do conceito da apologia é mostrar que falar de uma droga, como a Cannabis Sativa, que apresenta riscos reais ao usuário, sem levar em consideração esses aspectos, é além de crime, um contrasenso. A grande incidência de filmes
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que traz a Cannabis Sativa em sua narrativa de maneira a apenas louvar seu uso, ou mesmo colocando este uso de maneira banalizada, como se “todo mundo usasse” e só trouxesse benefícios, podem estar promovendo uma apologia da droga, o que poderá influenciar na formação das representações sociais acerca da droga, como também de sua aceitação entre a população, podendo aumentar o uso da substância. A próxima seção discorrerá sobre os efeitos da apologia das bebidas alcoólicas e dos cigarros, no cinema e na publicidade, na literatura.
14244600664.4 Apologia de alcóol e cigarro
Recorrendo à literatura, até mesmo a associação entre outras drogas com os meios de comunicação, como por exemplo o álcool e a propaganda, era frágil até poucos anos atrás. Existiam dificuldades de efetivamente provar a ligação entre a propaganda de álcool e o aumento do consumo desse produto, apesar de intuitivamente parecer que essa ligação é evidente. O argumento da indústria do álcool é que a propaganda é um instrumento de escolha de marcas para o indivíduo que já é um consumidor. (PINSKY e PAVARINO FILHO,2007) No entanto, há algumas evidências que o marketing pode ter um impacto sobre os jovens. As pesquisas indicam a influência cumulativa da propaganda de álcool em formatar as percepções dos jovens sobre o álcool e as normas do beber. A propaganda do álcool predispõe os jovens a beber bem antes da idade legal para compra. As inúmeras investigações na área feitas em diversos países concluem que os efeitos da propaganda no consumo de álcool por jovens são uma decorrência, principalmente, da exposição, apreciação e reconhecimento (lembrança) que esses indivíduos têm sobre as mesmas. (id.op.cit.) De acordo com Casita et al (2008), a indústria do tabaco, uma das financiadoras do cinema hollywoodiano, em acordo com os realizadores dos filmes, insere o cigarro, sua marca, na trama do filme, sendo uma maneira de conseguir vender seu produto em lugares onde a propaganda direta do cigarro é proibida. Essa publicidade encoberta nos filmes, promove a associação do tabaco com conceitos como glamour, sexo, triunfo, niilismo, revolução, aventura. Numerosos estudos documentam que jovens que assistem filmes com personagens fumantes, tem mais possibilidades de se tornarem fumantes.  298555_2316754890455_1744891076_n Fumar é uma aprendizagem, e ao longo de sua infância, crianças identificam o cigarro como algo do mundo adulto. A adolescência, período onde quer se ingressar no mundo adulto, é um período crítico para o início do consumo de substâncias adictivas. A indústria do tabaco precisa captar todo dia, no mundo inteiro, 80.000 novos fumantes que substituam os que perdem diariamente por consequente doença, morte, ou abandono do consumo. O cinema há muitos anos tem sido um fiel colaborador da indústria do tabaco. A Motion
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Picture Association of America, associação relativa ao cinema, líder do setor, em maio de 2007 anunciou uma nova política comercial de classificar filmes em que o cigarro aparece. Um pouco antes, no ano 2000, surgiu nos Estados Unidos o movimento Smoke Free Movies, para sensibilizar e mobilizar a opinião pública para conseguir diminuir ou eliminar a presença do tabaco nos 440px-Vertebrate-brain-regions filmes, para evitar que os filmes sejam um vetor de propagação da epidemia tabáquica. Os malefícios do cigarro são comprovados e inegáveis. Essa nova postura é produto de muitos anos de estudos e lutas judiciais nessa área, que permite o entendimento de que filmes glorificadores do tabaco recebam, no mínimo, classificação indicativa de público (CASITA et all, 2008) Em uma análise realizada por Stockwell e Gianz (1997), sobre os filmes produzidos entre 1990 e 1996, puderam indentificar que 57% dos protagonistas fumavam, contrastando com 14% de fumantes na população real que estava compreendida no nível socioeconômico que os protagonistas representavam. De acordo com a pesquisa, o exagero dessa porcentagem têm como objetivo distorcer a realidade social e aumentar a percepção de que fumar é habitual e natural, principalmente entre os jovens. Essa distorção é percebida na análise que será feita mais adiante dos filmes em relação à maconha. W. Leiss (apud Pinsky e Pavarino Filho, 2007), afirma que, com a proeminência da comunicação de massa na vida pública, decorreram preocupações relacionadas aos impactos da mídia. W. Leiss resume as análises desses impactos em duas categorias: a dos efeitos intencionados e a dos não-intencionados. Entre os primeiros, aqueles resultantes de campanhas com comerciais têm sido os mais investigados, de maneira a subsidiar as estratégias de investimentos empresariais. Já os efeitos não–intencionados da mídia – aquilo que supostamente não se almejou, mas produziu certa consequência – seriam de interesse para os encarregados de políticas públicas. Em alguns países, a investigação desses efeitos pode subsidiar e fundamentar os controles da mídia por legislação imposta ou voluntariamente pelas indústrias. Pelo código canadense, por exemplo, é proibido tentar associar à bebida alcoólica símbolos de status ou dar a entender, direta ou indiretamente, que a aceitação social, sucesso pessoal, negócios ou conquistas esportivas podem ser atingidas, engrandecidas ou reforçadas por meio do consumo de quaisquer dos produtos em foco. (PINSKY e PAVARINO FILHO, 2007) Na mídia impressa, tais como jornais e revistas, em um levantamento que realizou a análise documental da mídia escrita brasileira sobre o tema entre 1999 e 2003, cinquenta e nove por cento das matérias que citavam a maconha referiam-se à categoria “comportamento”. Em contrapartida, as matérias relacionadas ao “tráfico” (1%) foram as menos frequentes. O “consumo” foi a subcategoria na qual se classificaram 22% das matérias. Não houve ocorrência alguma sobre “benefícios do uso” e 4% das reportagens foram sobre os “malefícios do uso” desta droga. Em relação às outras drogas pesquisadas, a maconha foi a mais abordada na subcategoria “educação” (27%). Uma das
frase-sabe-o-que-eu-quero-de-verdade-jamais-perder-a-sensibilidade-mesmo-que-as-vezes-ela-arranhe-um-clarice-lispector-98241   33
conclusões desse levantamento foi que há uma incompatibilidade entre o enfoque dado pela mídia e o perfil de consumo de drogas no Brasil, fato que pode influenciar não só as crenças que as pessoas têm sobre determinadas substâncias, mas também as políticas públicas sobre drogas no país, uma vez que a mídia pode ser também uma importante ferramenta das estratégias de prevenção ou promoção de saúde da população. (RONZANI et al, 2009) O capítulo seguinte abordará os meios de comunicação em geral, antes de se aprofundar nos filmes. Falará de algumas mensagens propagadas relativas à droga Cannabis Sativa na televisão, nos jornais e revistas, na internet e na música, de maneira sucinta.
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14073246922_6b7c460dc0_b5 MEIOS DE COMUNICAÇÃO
Este estudo tenta mostrar a relevância de estudar os meios de comunicação e suas implicações sobre o uso da maconha e suas representações sociais, levando em consideração processos como a mensagem subliminar, a neuroplasticidade e o sistema de recompensa, bem como o conceito de apologia, com interesse nesta última, tendo como foco o cinema. A maconha é comercializada de maneira ilegal, através do tráfico de drogas, na maior parte do mundo. Embora esteja legalizada em alguns países, no geral se trata de uma substância ilegal e ilícita, não mostrada pela publicidade convencional, já que não se trata de uma marca. Ainda assim, os meios de comunicação trazem o tema, em suas diversas plataformas, com diferentes e múltiplas mensagens relativas à essa droga. Esse capítulo tem o objetivo de relatar a ocorrência do tema em outras mídias, como televisão, internet, mídia impressa e música, antes de introduzir os filmes. Levantar esses dados é importante para verificar se os meios de comunicação podem funcionar como indutores do uso da maconha, colaborando ou não como as mensagens com as que serão relatadas que estão sendo transmitidas pelo cinema. Tais exemplos serão apenas citados, pois como já se informou, o objetivo desta monografia é analisar especificamente vinte filmes da mídia cinematográfica.
5.1 Televisão
frase-quando-duas-pessoas-se-encontram-ha-na-verdade-seis-pessoas-presentes-cada-pessoa-como-se-ve-a-william-james-118796 Na televisão, além dos filmes reexibidos do cinema que serão tratados num capítulo próprio, no mundo das sitcons americanas e européias é frequente a referência à maconha. Esse conteúdo chega no Brasil através da televisão à cabo, e um número menor chega traduzido na TV aberta. Abaixo, em cada parágrafo, seguem descrições dos programas que, por si só, permitem ao leitor perceber as possíveis implicações sobre um público de idade variada, atingindo crianças, adolescentes, etc. Desenhos animados, como “South Park”, trazem o tema de maneira recorrente. No desenho “Os Simpsons”, em certo episódio, Springfield, a cidade do desenho, teve a maconha liberada medicinalmente. Hommer Simpson, o pai da família Simpson, entrou em cômicos delírios fumando a erva receitada. A figura paterna está neste episódio retratada de maneira cômica e banal, colocando a figura de autoridade, que disciplinaria e é pertencente ao mundo adulto, de maneira pueril e inconsequente. Faz muito sucesso no mundo todo, o seriado da TV americana, “Weeds”, “erva” em português, em que uma dona de casa, representada pela atriz Mary Louise-Parker, em situação difícil após enviuvar, passa a vender maconha plantada no quintal de casa à vizinhança e passa e
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ganhar muito dinheiro. A série é acusada de fazer apologia, embora produtores e fãs neguem, dizendo que a série faz uma crítica social. Roberto Benabib, produtor-executivo do seriado, defende que o tema da maconha em séries era um dos últimos considerados “intocáveis”. (ARAÚJO, 2008) Ainda na esfera dos seriados americanos, “Two and a half man”, comédia exibida pela Fox desde setembro de 2003, traz como protagonistas dois homens adultos e uma criança de 10 anos, sobrinho do protagonista da série. No final da oitava temporada, em 2011, o ator Charlie Sheen, que interpreta o protagonista, é afastado das gravações para tratar de sua dependência química, quando também é desligado da série. Sua saída promove alterações no 916b08533f2a0f4bdcaeccaba3d8686aenredo e o personagem Jake Harper, a criança crescida e então com 18 anos, estréia a nova temporada como um usuário de maconha, sendo que a maconha, em forma de cigarros, brownies, aparece em aproximadamente todos os episódios da oitava e nona temporada. “Two and a half men” é a quarta série mais assistida nos EUA no ano de 2013, em uma lista de 50 séries, de acordo com Nielsen, uma espécie de Ibope americano. “De Volta Pra Pista”, série de comédia semanal do canal brasileiro GNT, no episódio 11 da primeira temporada, exibido em janeiro de 2014, um dos personagens principais faz a defesa da droga, com a fala: “Não faz mal não… Previne o glaucoma, ajuda no desenvolvimento cerebral, você vai ficar muito mais criativa… Você que é publicitária vai criar altas campanhas… e outra coisa, previne Alzheimer…”. Claramente a série divulgou neste episódio os benefícios de maneira pueril e falsa em sua maioria, inventando benefícios “ajuda no desenvolvimento cerebral”. “A Grande Família”, série brasileira transmitida pela rede Globo desde 2001, está na sua décima terceira temporada. Possui dois episódios que tratam da maconha, com o sugestivo nome “Um tapinha não dói” onde o personagem Lineu, pai da família representado pelo ator Marco Nanini come por engano biscoitos feitos com maconha e fica sob o efeito da droga. Aqui, parecido com o episódio já mencionado dos Simpsons, novamente a figura paterna é colocada de maneira a representar uma figura de autoridade transgredida. A série possui também o episódio “A Marcha”, onde o personagem Tuco, filho da família, é visto na polêmica Marcha da Maconha, e toda uma discussão é desencadeada a partir desse ponto. A novela de Glória Perez, “O Clone”, exibida em 2002, pela Rede Globo de Televisão, por sua vez, apresentava uma dependente química em estado deplorável, vivida por Débora Falabela. Havia também Osmar Prado, no papel de um alcoólatra. As fortes cenas de descontrole, síndrome de abstinência, desvios comportamentais e miséria física e emocional mobilizaram a opinião pública, reforçado pela inserção de trechos de depoimentos de dependentes químicos reais. (ARAÚJO, 2008) O canal Discovery exibe atualmente a série documental “Vende-se maconha” e em sua sinopse diz revelar os bastidores do polêmico negócio da venda controlada de maconha nos Estados
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Unidos. O Canal Brasil, da TV por assinatura, tem um programa culinário chamado “Larica Total”, sendo que o termo larica se refere a fome que o usuário sente após o uso.
5.2 Revistas
Na mídia impressa brasileira, em especial as revistas, a edição de 10 de maio de 2013 da Carta Capital trouxe o tema sobre a maconha com a capa “Legalizem as Drogas!”, e sua ilustração da capa trazia a maconha no cano das armas, em referência às flores que os pacifistas encaixam na mesmas. A revista Mente Cérebro, na publicação de dezembro de 2012, trouxe a matéria “A ciência e o medo: Informações distorcidas pela mídia alimentam o pânico moral a respeito de temas polêmicos, como a maconha.” Essas revistas em suas matérias dizem estar prestando resposta a edição da revista Veja de 26 de outubro de 2012, com a capa “Maconha: Novas descobertas da medicina cortam o barato de quem acha que não faz mal”. Existem ainda revistas especializadas pró-maconha, como a Revista argentina “THC – A revista da cultura cannábica”.
cf5da9c563fc0d72b386ad93d0968a3e 5.3 Internet
Na internet, existem muitos sites e blogs como os brasileiros “Diário da Erva”, “Planeta Maconha”, “Hempadão”, “Marcha da Maconha”, “Semente Maconha” que compartilham informações tais como listagem de filmes “para se assistir chapado”, como também relatos de usuários, fornecem ainda receitas com a erva e ensinam maneiras de fumá-la, fotos de famosos fumando, concursos como “Miss Marijuana” e muitas outras informações fornecidas por leigos. Existem também os internacionais “Sensi Seeds Bank”, “Hipersemillas.com” e “Growshop Germinia”, com o mesmo objetivo.
5.4 Música
No mundo da música, de forma velada ou explícita, existem as que fazem apologia da droga. Lobão, Lulu Santos, Gabriel o Pensador, Fernanda Abreu, Gilberto Gil, Cidade Negra e Marcelo D2 , o fundador do explícito Planet Hemp (na traducao, Planeta Maconha), são alguns dos muitos nomes da música brasileira que, em algum momento, foram flagrados portando, consumindo, mas acima de tudo, cantando canções que fazem apologia da droga. (ARAÚJO, 2008) “Queimando Tudo”, letra de Marcelo D2, consta o brado do consumidor divulgando as vantagens do consumo de maconha: “Eu canto assim porque eu fumo maconha (…) Quer me prender só porque eu fumo cannabis sativa / Na cabeça ativa, na cabeça ativa / E isso te incomoda? /
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Cerebro  Eu falo, penso, grito e isso pra você é foda / A mente aguçada mermão / Eu sei que isso te espanta / Mas eu continuo queimando tudo até a última ponta…Olhe pra mim, veja as pupilas dilatadas / É a mente trabalhando, eu não vou te fazer nada Sinta os efeitos da fumaça sonora, e não se esqueça / Planet hemp, fazendo a sua cabeça ”. O rapper Gabriel, o Pensador, na letra “Cachimbo da paz”, contida no álbum Quebra-Cabeça de 1997, canta: “Apaga a fumaça do revólver, da pistola / Manda a fumaça do cachimbo pra cachola / Acende, puxa, prende, passa / Índio quer cachimbo, índio quer fazer fumaça / Maresia, sente a maresia maresia, uuu…”. Mais antiga, a canção “Malandragem dá um tempo”, do album “Alô Malandragem, Maloca o Flagrante” de Bezerra da Silva lançado em 1986 pela Gravadora RCA/BMG e traz a letra: “Vou apertar, mas não vou acender agora / Vou apertar, mas não vou acender agora / Se segura malandro, pra fazer a cabeça tem hora / É você não está vendo / Que a boca tá assim de corujão / Tem dedo de seta adoidado / Todos eles afim de entregar os irmãos / Malandragem dá um tempo / Deixa essa pá de sujeira ir embora / É por isso que eu vou apertar, mas não vou acender agora”. Como pôde ser visto neste capítulo, existe uma situação de apologia generalizada pelos meios de comunicação como um todo, demonstrando que os filmes da arte cinematográfica, embora foco da monografia, não atuam isoladamente neste processo. O próximo capítulo focará nos filmes, falará ainda sobre quais são os critérios de Classificação Indicativa para obras audiovisuais cinematográficas no Brasil, e trará ao fim a lista dos vinte filmes levantados e analisados, com seu ano de produção comprendido entre 2011 e 2013.
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96021747897ac6afbc2b69eae0a0eb536 FILMES
De acordo com Carlini et al (2003), a mídia pode retratar tanto uma tendência em relação ao contexto no qual está inserida, quanto influenciar na formação de crenças e atitudes sobre determinados assuntos. Os filmes cinematográficos são uma forte mídia em termos de alcance de público, e possuem a liberdade pra tratar de qualquer tema, legal ou ilegal. Em geral, diferente de peças teatrais ou publicitárias, sua promoção e exibição tem alcance mundial, tanto no circuito das salas de cinema como na televisão, assim como através do DVD e da internet. (CASTALDELLI-MAIA et al, 2012) O tema da droga aparece de diversas maneiras e é recorrente. Esse motivo gerou a escolha dos filmes como foco do estudo. Os filmes também são um registro fechado do material ao qual se quer observar, que pode ser consultado com facilidade no caso de verificação dos dados levantados. Filmes sobre drogas são tão antigos quanto o próprio cinema, começando em 1897 com o filme Pium Den, de William Kennedy Dickson. Há anos que eles retratam o hedonismo e o uso de substâncias psicoativas, gerando e reproduzindo impactos sociais. Alguns são mais realistas, outros mais fantasiosos. (op/cit.) Sendo assim, o cinema atua como meio de difusão de informações fortíssimo, propagando mensagens ao passo que promove e/ou reproduz valores, podendo também ser um meio de propaganda, propagando produtos e idéias. (id.,ibid.) Para B. J. Oliveira (2006), a vivacidade das imagens e sua reprodutibilidade facilitam sua aceitação como pura representação da realidade. Mesmo sabendo que são montadas, o encantamento do fluxo de imagens fazem o espectador reagir como se fosse a própria realidade. Há também o fenônemo das mensagens subliminares, do priming semântico, e as informações sobre a estrutura cerebral denominada sistema de recompensas, já abordados nos capítulos 4 e 3, respectivamente. Várias escolas médicas de todo o mundo usam, em seus currículos de graduação, os filmes como instrumento de aprendizagem. Então, usar filmes como ferramenta de ensino pode ser um meio poderoso para envolver os alunos , esclarecendo assim os seus equívocos e tendo a finalidade de educá-los sobre os fatores culturais, biológicos, psicológicos e sociais da dependência psicoquímica, por exemplo. (CASTALDELLI-MAIA, et al, 2005) Em geral os filmes de entretenimento trabalham com a fantasia e o emocional, provocando respostas emocionais da platéia, muito mais que cognitivas, por não terem a obrigação de serem explanações racionais ou científicas de um tema. (CASITA et al, 2008) De acordo com D. Araújo (op.cit.), acerca dos filmes que apresentam a temática da
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clarissa_pinkola_quot_os_lobos_saudaveis_e_as_mulheres_l3340nw maconha, existem até mesmo festivais específicos como o “HOLLYWEED, o primeiro Festival Internacional de Cinema Psicoactivo”, realizado em 2007 no Chile. O nome do festival oferece um claro trocadilho entre Hollywood e Hollyweed, em tradução literal “Santa Maconha”. Festivais como esse promovem a apologia da droga de maneira clara, levando um grande público de usuários dependentes ao evento. Nesta monografia, no entanto, será levantada uma lista de filmes com amplo alcance de público, de filmes que são exibidos no circuito aberto das salas de cinema pelo mundo, que, diferente do festival citado acima, não apresenta referência direta à droga (embora alguns títulos deixem clara a referência). Esses filmes podem ser tão perigosos na promoção da apologia quanto os do festival, porém com o agravante de que o público possa não ter escolhido previamente assistir a conteúdo apologético no filme, inserido em forma de mensagens subliminares ou mesmo claramente banalizado pelo uso recorrente dos personagens, em tramas que colocam o uso da Cannabis Sativa de maneira aleatória, sem nenhuma ligação direta com a narrativa do filme. Existe, no entanto, uma classificação que alerta sobre o conteúdo do filme antes dele ser assistido. A próxima seção abordará os critérios brasileiros da Classificação Indicativa, que corresponde à recomendação por faixa etária que um filme recebe, orientando a idade mínima que o público precisa ter para assistir ao filme.
capas-facebook-frases_0456.1 Classificação Indicativa
O uso indevido de drogas é alvo de debates e questionamentos nos diversos segmentos da sociedade e tem sido considerado um problema de saúde pública que afeta, sobretudo, jovens e adolescentes. Esse fenômeno tem suscitado preocupação, pois além de provocar uma pluralidade de danos aos usuários, envolve a sociedade de maneira geral (BASTOS, 2003; BUCHER, 1998). Esse subcapítulo é relevante para revelar que já existem critérios e profissionais que lidam com a problemática do conteúdo de idéias e mensagens que um filme pode propagar, e aqui, em especial, será destacada a temática das drogas. A Classificação Indicativa é a indicação à família sobre a faixa etária para a qual obras audiovisuais não se recomendam. O trabalho de monitoramento é contínuo e embasado nos critérios de quantidade, relevância, contextualização e intensidade de cenas que contenham sexo, violência e drogas. A Classificação Indicativa é embasada na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente, nas Portarias MJ nº 1.100/2006 e nº 1.220/2007 e no Manual da Nova Classificação Indicativa (Portaria SNJ nº 8/2006). A Portaria MJ nº 1.100/2006 regulamenta a Classificação Indicativa de diversões públicas, especialmente obras audiovisuais destinadas a cinema, vídeo, DVD, jogos eletrônicos e de interpretação (RPG) e as Portarias MJ nº 1.220/2007 e SNJ nº 14/2009
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regulamentam as obras audiovisuais destinadas à televisão. Nesse caso, a Classificação vincula a faixa horária à etária. A portaria entrou em vigor no dia 11 de julho de 2007. No entanto, a classificação tanto pode ser feita por autoclassificação como por análise prévia. A autoclassificação é adotada pelas emissoras de televisão, que inscrevem o processo no Ministério da Justiça sem a necessidade de enviar a obra audiovisual. Após a estréia do programa, haverá o monitoramento pelo Departamento de Justiça,  01750 - FRASE - MUDE MAS COMECE DEVAGAR - CLARICE LISPECTOR - CAPAS PARA FACEBOOK Classificação, Títulos e Qualificação (DEJUS), que terá até 60 dias para confirmar ou indeferir a classificação pretendida pela emissora. Já a análise prévia se aplica aos mercaos de cinema, vídeo/DVD, jogos eletrônicos e RPG. Para este serviço o requerente deve enviar a obra e a classificação pretendida para a Coordenação de Classificação Indicativa (CONCID), que analisará e publicará a classificação indicativa atribuida no Diário Oficial da União (DOU). Somente após publicação, a obra estará apta para exibição. Diferente da censura, a classificação é um processo democrático, dividido entre o Estado, as empresas de entretenimento e a sociedade. O Ministério da Justiça não proíbe a transmissão de programas, a apresentação de espetáculos ou a exibição de filmes, porém cabe a ele informar sobre as faixas etárias e horárias para as quais os programas são recomendado. Assim, a família tem o direito à escolha garantido e as crianças e adolescentes o seu desenvolvimento psicossocial preservado. Os pais podem autorizar, mediante a assinatura de um termo de responsabilidade, o acesso dos filhos a filmes e espetáculos com classificação indicativa superior à faixa etária, desde que acompanhados de um adulto. Nessa autorização, o pai também deverá atestar que tomou conhecimento da classificação indicativa realizada pelo Ministério da Justiça. A regra não vale para filmes acima de 18 anos. O Manual da Nova Classificação Indicativa (2006) estabelece diversos critérios para o estabelecimento da faixa etária apropriada para o filme. Na Tabela 1 (página 41) foram destacados os relativos às drogas ilícitas.
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images (9) Tabela 1

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Por Celso Lugão

Especializações em PSICOLOGIA CLÍNICA E HOSPITALAR. Exerce ATIVIDADE CLÍNICA fazem mais de 30 anos, tendo criado sua abordagem particular de PSICOTERAPIA ESTRATÉGICA. Possui MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL PELA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Atualmente é professor do INSTITUTO DE PSICOLOGIA DA UERJ tendo criado o setor de PSICOTERAPIA ESTRATÉGICA NO SPA DA UERJ EM 1988 e desde então atua como SUPERVISOR desta abordagem. Participou de forma intensiva do PROCESSO DE VALIDAÇÃO DA HIPNOSE como TÉCNICA PASSÍVEL DE SER UTILIZADA PELO PSICÓLOGO, fato este reconhecido pela SOCIEDADE BRASILEIRA DE HIPNOSE e pela SOCIEDADE DE HIPNOSE E MEDICINA DO RIO DE JANEIRO. Possui experiência em várias áreas da psicologia, a saber: EPISTEMOLOGIA DAS PSICOTERAPIAS (DESENVOLVIMENTO DE REFERENCIAIS EPISTEMOLÓGICOS E CLÍNICOS; ESTUDO DAS PERSPECTIVAS ESTRATÉGICA, ESTRUTURAL E SISTÊMICA EM RELAÇÃO AO INDIVÍDUO E A FAMÍLIA) ; PSICOLOGIA CLÍNICA E HIPNOLOGIA (TRANSDUÇÃO DA INFORMAÇÃO MENTE-CORPO, PSICOIMUNOLOGIA, TÉCNICAS HIPNÓTICAS, CORPORAIS, PSICODRAMÁTICAS E ESTADOS ALTERADOS DA CONSCIÊNCIA); TANATOLOGIA (MORTE, LUTO E SEPARAÇÕES); PROCESSOS DISSOCIATIVOS (TRAUMA, DISTÚRBIO DISSOCIATIVO DA IDENTIDADE, SÍNDROME DO STRESS PÓS-TRAUMÁTICO, SÍNDROME DO PÂNICO, SUICÍDIO, DROGADICÇÃO, PSICOSES); E ASPECTOS PEDAGÓGICOS DA SUPERVISÃO (TREINAMENTO, INFORMAÇÃO E FORMAÇÃO ). (Text informed by the author)

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